Boas ideias não bastam para implantar uma política pública. É preciso que ela seja tecnicamente correta, politicamente suportável e organizacionalmente implementável 

 Por Matheus Delbon

 

Estamos nos aproximando da reta final do mandato de nossos prefeitos. Além das conversas naturais, como preocupação com reeleição, fazer o sucessor, críticas e elogios, um fenômeno novo chama a atenção: as frequentes rupturas internas dos governos, seja com o prefeito e seu vice, sua base aliada, seu secretariado ou simplesmente com seus eleitores. 

 As últimas eleições municipais iniciaram um ciclo novo do voto – por propostas, por idealismo, por programas de governo. Resumindo, majoritariamente escolhemos nossos candidatos pelas propostas públicas, pelas ideias que eles apresentaram. 

 Mas passados quase três anos, muitos governantes, embora bem intencionados, não produziram o resultado esperado, as ideias boas não saíram do papel. Por quê? 

 O que vimos foram boas ideias. E, a meu ver, tecnicamente corretas, vindas de políticos que estudaram as melhores teorias e formas de governo. Mas, para que uma política pública possa ganhar vida, são necessários outros dois eixos formando um tripé de sustentação. Isso não ocorreu e daí iniciaram os problemas. 

 Para ter uma solução tecnicamente correta, é preciso perguntar se ela é politicamente sustentável, quem apoia e quem se opõe à medida. Mais ainda, quem precisa ser convencido para apoiar e se, entre os que apoiam, há força política suficiente para o projeto. Além disso, nada é fácil em política, o orçamento é rígido e os recursos escassos. Para fazer algo será preciso deixar de fazer outra coisa e, neste caso, alguém perderá. 

 Muitos não observaram este ponto do processo de construção de uma política pública, e por terem uma solução tecnicamente correta não aceitaram oposição a ela. Iniciaram bravatas, discussões e o diálogo se resumia em um lado dizendo que ela era correta e o outro que não queria, porque havia interesses internos, lobbies ou simplesmente porque consideravam outras soluções. 

 Iniciar uma política pública sem realizar uma cuidadosa matriz de quem a apoia ou se opõe e qual a força política destes agentes é simplesmente mergulhar em um lago raso, imaginando que é profundo. 

 E, mesmo se possuir uma solução tecnicamente correta, ser politicamente suportável, ainda temos um desafio final de saber se esta política pública é organizacionalmente implementável. Ou seja, o governo está estruturado para esta ação, os servidores públicos possuem as habilidades necessárias, os órgãos da administração pública estão equipados e com funcionários suficientes? E mais, o que será preciso licitar, treinar, coordenar? 

 Sem ter tudo planilhado é melhor nem começar, pois provavelmente vamos ficar pelo meio do caminho. Ou você sai de viagem, sem se assegurar se possui combustível e dinheiro para os pedágios, por exemplo? 

Mas parece que muitas vezes o governo faz isso. Coloca em prática um projeto sem verificar os recursos operacionais. E se não dá certo, inicia uma caça aos possíveis culpados: servidores, oposição, clima, governo estadual ou federal. E a lista continua… 

 Mas, em geral, em algum momento ou quando não se obtém suporte político ou não se consegue implementar, surge o inimigo interno. Quem de dentro do governo é o responsável? Afinal, como uma politica pública tecnicamente correta não daria certo? Aí os governos começam a rachar e cada um sai dizendo que poderia fazer diferente… que irá fazer… Será? 

 Infelizmente, ter uma solução tecnicamente correta é apenas um dos eixos de sustentação. A melhor solução irá fracassar se antes mesmo de propormos não pensarmos de forma ampla e com um mapeamento detalhado dos outros dois eixos. 

 

* Esta crônica que você está lendo faz parte do livro “CIDADES EFICIENTES: Crônicas da administração pública”, de autoria de Matheus Delbon.

O autor gentilmente autorizou a republicação deste texto, desde que a fonte seja devidamente citada e o conteúdo não seja alterado ou adaptado de qualquer forma.

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